Congresso debate as transformações da atividade na era digital e faz corretores refletirem sobre a necessidade de inovar e ousar.
A tecnologia não será capaz de substituir o serviço prestado pelos corretores de seguros. No entanto, a categoria deve refletir sobre a necessidade de ousar e inovar. Este foi o recado de Armando Vergílio dos Santos, presidente da Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor), durante o 20º Congresso Brasileiro dos Corretores de Seguros, promovido pela entidade nos dias 12, 13 e 14 de outubro, em Goiânia (GO). Com o tema central “O Setor de Seguros na Era Digital”, o evento reuniu mais de 2 mil pessoas para debater o futuro da categoria frente às transformações tecnológicas.
“Faltam soluções arrojadas. Há uma crise de criatividade”, afirmou Armando Vergílio. Nessa mesma linha, o professor e webativista Gil Giardelli destacou que a integração à era da inovação requer não apenas a mudança de paradigmas, como também uma nova mentalidade. “Com as transformações provocadas pelas plataformas digitais, quem não estudar e der chance à criatividade, abrindo-se ao novo, poderá perder lugar no mercado”, disse. Segundo o especialista, o avanço da tecnologia permitirá o uso em escala da automação robótica em diversas áreas produtivas e não apenas na indústria automobilística. Ele forneceu uma pequena amostra desse futuro com a apresentação de um robô humanoide, que interagiu com a plateia.
A expansão da conectividade está abrindo um universo de novas oportunidades para o uso de dados. Segundo Ronaldo Lemos, comentarista da GloboNews e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio), na área de saúde, por exemplo, já existem aplicativos que remuneram pessoas saudáveis. “Dados mudam a forma de se gerenciar riscos e esta é uma grande oportunidade para o mercado de seguros”, disse. Lemos afirmou, ainda, que a análise de dados poderá ser uma exigência para os corretores que quiserem empreender na era digital. “Todo corretor tem a possibilidade de conhecer melhor o seu cliente, seus hábitos e necessidades”, disse.
A profissão de corretor de seguros vai desaparecer? “Não acredito, porque atividades não desaparecem, mas apenas se modificam”, disse Thiago Camargo Lopes, secretário de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Sua avaliação é que o mercado segurador, mais do que outros setores, tem todas as condições para fazer o melhor uso de dados. “As seguradoras sabem onde ocorrem mais roubos e furtos e também conhecem o estado de saúde de seus segurados. Estas informações poderiam servir para a criação de políticas públicas, ou para definir, por exemplo, a melhor disposição regional de delegacias, bem como para o desenvolvimento de programas de prevenção à saúde, já que as seguradoras querem seus segurados saudáveis”, disse.
O diretor-Geral da Bradesco Seguros, Marco Antônio Gonçalves, também não acredita que o corretor de seguros será substituído por novos canais criados a partir do uso da tecnologia. Mas, frisou que o setor precisa avançar no uso da tecnologia ou em cinco anos será superado pela indústria automobilística, que já se prepara para produzir veículos com alta conectividade. Já Luciano Snel, presidente da Icatu Seguros, disse que não adianta aceitar uma identidade digitalizada para facilitar a venda, se demorar 20 dias para dar retorno ao cliente de que falta um documento. “Ser digital não é trocar papel por meio eletrônico, mas fazer o mesmo processo com mais rapidez”, disse.
“A era digital não é futuro, é agora”, disse a CEO da Ragaz Assessoria de Treinamentos, Claudia Simplício. Segundo ela, a tecnologia não substituirá o papel do corretor, desde que ele seja reconhecido pelo cliente por seu valor. “Precisamos focar nas necessidades do cliente para que ele seja um lead constante”, disse. Agregar valor é a forma de o corretor se tornar imprescindível para seu cliente, orientou Martha Gabriel, escritora e palestrante internacional nas áreas de Marketing, Inovação e Educação. “Se quiser intermediar tem de dar um serviço consultivo que a pessoa não encontrará tão facilmente”, disse.
Na era digital, uma das ameaças ao emprego é a machine learning, sistema que faz a análise de dados e aprende por repetição a realizar tarefas. O alerta foi do jornalista Pedro Doria, editor do Canal Meio. Segundo ele, um estudo da PwC mostra que nos próximos 15 anos, 38% dos empregos nos Estados Unidos serão extintos, incluindo o corretor de seguros. Já o consultor da McKinsey, João Bueno, fez o contraponto ao informar que em países da Europa apenas 20% das vendas são feitas de forma direta. “Se os corretores usarem bem a tecnologia, acredito que vão agregar valor e dar uma nova experiência ao cliente”, disse.
O futuro do seguro automóvel
“Os desafios do seguro de automóvel” foi tema do painel que também discutiu a era digital e o combate à proteção pirata. Para o presidente da HDI Seguros, Murilo Riedel, o declínio do seguro de automóvel, provocado pela queda na venda de veículos, trará aos corretores o desafio de trabalhar com uma carteira de veículos mais velhos. “Nos próximos três anos, nós precisaremos aprender a trabalhar esse mercado, ofertando produtos mais baratos, mais simplificados e mais econômicos”. Para Luiz Pomarole, diretor Geral de Automóvel da Porto Seguro, essa é a oportunidade para deslanchar o seguro auto popular e, ainda, combater o seguro pirata. “Demanda não falta”, segundo ele, já que apenas 30% da frota nacional é segurada.
O avanço da proteção veicular oferecida irregularmente por associações e cooperativas foi um dos temas recorrentes do evento. A grande indagação em relação ao assunto é se o mercado de seguros pode, indiretamente, ser responsabilizado por esse avanço, por recusar cobertura para alguns tipos de veículos, com base no critério de idade, localização etc. “Há muitas interpretações equivocadas. Não acho que a proteção veicular ocupou o espaço deixado pelo setor de seguros”, disse o presidente da CNseg, Marcio Coriolano.
“Eu acredito, firmemente, que o surgimento das cooperativas é resultado da falta de oferta de produtos e serviços pelas seguradoras”, disse o deputado federal Lucas Vergílio (SD-GO). Ele relatou sua dificuldade na defesa do Projeto de Lei 3139/2015, de sua autoria, que criminaliza a atuação irregular de associações e cooperativas. “A interlocução do mercado de seguros com o Congresso Nacional é muito ruim”, disse. Por outro lado, o superintendente da Susep, Joaquim Mendanha, garantiu que a autarquia está trabalhando no combate à proteção veicular. Ele contabiliza 180 ações civis públicas e 200 processos administrativos para apurar indícios de irregularidades. Mendanha mencionou, ainda, a disposição da Susep de agir para viabilizar o seguro auto popular, estabelecendo prazo para a divulgação de soluções.
Resiliência do setor
A evolução do mercado seguros em meio à crise foi notada pela jornalista especializada em economia da GloboNews, Denise Barbosa. Para Marcio Coriolano, o setor de seguros tem demonstrado resiliência e ainda será protagonista do crescimento econômico do país. No âmbito regulatório, o superintendente da Susep expôs os avanços da autarquia, como a aprovação do marco regulatório do VGBL e PGBL. “Esses produtos criarão um novo mercado de trabalho para os corretores, o mercado de annuities”, disse.
O presidente da Bradesco Seguros, Octavio de Lazari, afirmou que o corretor de seguros é o elo mais forte na corrente que também inclui segurado e seguradora. Em relação às novas tecnologias, ele não duvida que o papel do setor seja o de agente das mudanças, em vez de vítimas. Por fim, o presidente da Fenacor comentou o sucesso do congresso, ressaltando que o melhor resultado foi provocar os corretores a refletirem sobre o atual momento de disruptura e a necessidade de mudanças.