Seguro auto popular ainda é aposta do setor
Produto seria a solução expandir carteira de seguro automóvel, mas apenas duas seguradoras iniciaram – com sucesso – a comercialização.

Criado para conquistar o mercado de mais de 30 milhões de veículos que não têm seguro, fatia correspondente a cerca de 70% da frota nacional, o seguro popular de automóvel ainda está longe de atingir esse objetivo. Por enquanto, apenas duas seguradoras oferecem o produto, Azul Seguros e a Tokio Marine Seguradora. Mas, apesar da experiência bem sucedida de ambas, o auto popular ainda não deslanchou. No debate promovido pela APTS, dia 29 de agosto, no auditório do Sincor-SP, José Nogueira dos Santos, o vice-presidente do Sindirepa-SP, sindicato que representa o setor de reparação de veículos, apresentou o seu ponto de vista. “O alto preço das peças combinado com a Lei do Desmonte, que precisa ser discutida amplamente pela sociedade e que ainda demora a ser consolidada, eleva o aumento de furto de veículos e o comércio ilegal de peças”.
Para Nogueira, a Lei do Desmonte (12.977/2014) ainda não oferece solução para atender toda a demanda, pois a capacidade de abastecimento dos estabelecimentos legalmente instalados não atende a 1% da demanda do mercado de sinistro. “Enquanto a rede independente está presente em 5.572 municípios do Brasil, as concessionárias têm presença em apenas 578 municípios, e não têm capacidade instalada para atender toda a demanda”, diz. Segundo ele, nos Estados Unidos, por exemplo, o trabalho de desmontagem de veículos é realizado pelas próprias montadoras. Além de reconhecer a evolução do mercado independente de peças novas, Nogueira destacou a importância do reparador independente para a consolidação de qualquer projeto de melhoria de mobilidade. “O objetivo da Câmara de Colisão é a aproximação do mercado reparador com o segurador, para que haja mais segurança, pois, somos um dos elos desta cadeia produtiva”.
Garantia da qualidade
Representando a Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor), o vice-presidente na região Sudeste e presidente do Sincor-SP, sindicato paulista da categoria, Alexandre Camillo, toca em um ponto crucial para a evolução do seguro auto popular: a garantia da origem e do estado de uso das peças recuperadas provenientes de desmanches. De acordo com a Lei do Desmonte, caberá aos Detrans dos estados regimentar e fiscalizar as empresas de desmontes para o registro e controle da origem das peças. “Criou-se a expectativa de usar peças recuperadas para reduzir o preço do seguro e a partir daí atender uma parte dos consumidores que está à margem do seguro. Mas, o fato é que isso não se tornou realidade”, afirma.

Segundo Camillo, o entrave para a atuação dos Detrans é a ausência de um sistema informatizado, cujo custo atual está na casa de milhões de reais. “Apenas o Detran de São Paulo adquiriu esse sistema”. Ele conta que nos seminários itinerantes sobre a Lei do Desmonte, realizados pela Fenacor, fica clara a necessidade de se equipar os Detrans para a consolidação da Lei. “Aí sim pode se pensar no seguro auto popular. A Fenacor e a Confederação Nacional das Seguradoras se debruçaram novamente sobre o assunto, buscando soluções efetivas. Neste sentido, serão retomados os seminários sobre a Lei do Desmonte, em locais a serem programados, pelos estados de maior frota circulante. Está se avaliando também a força de contribuição juntos aos Detrans na obtenção destes sistemas. Acredito firmemente que, em breve, teremos boas novidades”, diz.
Ampliar a base
Felipe Milagres, diretor da Azul Seguros, destaca que a missão da empresa é ampliar a base de segurados. Na região Sudeste, cerca de 15,6 milhões de veículos circulam sem a proteção do seguro, dos quais quase 9 milhões somente em São Paulo. A seguradora também enxergou oportunidade no envelhecimento da frota nacional, cuja penetração do seguro é proporcionalmente menor quanto maior a idade do veículo. Entre 4 e 10 anos, apenas 38% possuem seguro e acima desse patamar somente 10%. Outro dado a considerar é a alta na venda de carros usados, que cresceu quase 10% até junho deste ano.
Pesquisas que revelam os motivos pelos quais os donos de veículos não compram seguro ajudaram a Azul Seguros a direcionar a construção do seu produto. Com base na justificativa dos entrevistados que consideram o seguro caro, a empresa adotou a solução de um produto enxuto com preço competitivo. Em relação à baixa percepção do valor do seguro, a solução foi tornar o produto fácil de entender, com perfil simplificado e coberturas básicas.
Mas, o seguro auto popular se tornou viável para a seguradora somente após a publicação da Resolução CNSP nº 340, em dezembro de 2016, que permitiu o uso de peças de desmontagem oriundas de empresas credenciadas e também peças de reposição novas, desde que apresentem as mesmas especificações técnicas do fabricante. Com isso, a Azul pode reduzir o preço do seu produto a partir do uso de uma cesta de peças, que inclui peças originais, peças de desmontagem provenientes da Renova Ecopeças, empresa da Porto Seguro criada há três anos, e peças de fabricantes homologados e certificados.
Para o conserto de um Celta, por exemplo, com batida frontal e danos à parte mecânica, o uso da cesta de peças resultaria em uma economia de mais de 28% no serviço. Milagres explica que na composição do prêmio de seguro, 40% são destinados ao pagamento de roubo e furto; 30% para perda total; e 30% para perda parcial. Desta última, 20% correspondem ao valor da peça e 10% ao custo da mão de obra. “Mesmo assim, não é possível economizar 20% com o uso de peças de desmontagem porque as peças de mecânica devem ser originais”.
Boas perspectivas
O sucesso do seguro de automóvel que oferece cobertura de roubo mais o rastreador, lançado há um ano, abriu caminho para a Tokio Marine Seguradora criar o seu seguro popular de automóvel. a empresa optou por utilizar no reparo de veículos peças novas compatíveis, que são oriundas do mercado alternativo, com as mesmas especificações técnicas do fabricante. “Por um simples motivo: é um mercado mais maduro do que o mercado de desmonte, além de ser o tipo de peça que os consumidores, provavelmente, utilizariam, se não tivessem seguro”, diz o diretor Luiz Padial.
O seguro popular da Tokio Marine está disponível para 16 tipos de veículos (passeio, caminhões e utilitários de carga), cuja combinação pode atingir mais de mil versões. Ele também destacou a abrangência de oferta do produto, presente em dez cidades do país, adiantando que a empresa já somou outras dez cidades à lista. Em seis meses de operação, a empresa vendeu mil apólices, somando R$ 1,4 milhão em prêmios, e indenizou apenas nove sinistros, dos quais somente um por perda parcial.
“Acompanhamos cada venda, até para ter a certeza de que foi uma venda consciente, e nos casos de sinistros, também verificamos o serviço da oficina”, diz Padial. Outra preocupação da empresa foi estudar o seu grupo de segurados do auto popular para identificar características comuns. O estudo revelou que 62,3% dos seguros são de novos clientes. “Aquilo que almejávamos foi alcançado, o que nós dá tranquilidade para buscarmos esse mercado”, diz.
Também foi identificado o perfil do segurado, que é composto em sua maioria (52,4% das vendas) por um público mais jovem, entre 18 e 40 anos, a maior parte residente em zonas periféricas das cidades. Com base em dados da Fenabrave e da consultoria Tendências que preveem o crescimento de 6% nas vendas de veículos novos neste ano e de 11,3% em 2018, a Tokio Marine calcula que no médio prazo a venda de seguro auto popular represente 15% de sua carteira. “O mercado está crescendo e as perspectivas são boas”, diz Padial.