A lei define o conceito de prescrição e os prazos, mas a sua aplicação ainda gera divergências.
O Código Civil tentou pacificar as controvérsias sobre prescrição, definindo o seu conceito como “a perda da pretensão em virtude da inércia de seu titular no prazo fixado em lei” (art. 189). Também criou um critério sistemático, separando os prazos prescricionais dos prazos decadenciais. Mesmo assim, juízes e advogados divergem sobre o tema e, no âmbito do seguro, o entendimento também não é pacífico. “Por isso, é sempre oportuno revisitar a matéria para atualizar o conhecimento sobre a prescrição”, diz Plinio Rizzi, advogado especializado em seguros.
Plínio trouxe a questão ao debate em Palestra do Meio-Dia, realizada no dia 18 de março, quando apresentou o tema “A Prescrição – sua aplicação na instituição do seguro”. Ele iniciou a abordagem pela definição da prescrição como “a perda da ação que protege um direito, pelo decurso do tempo, sem iniciativa do interessado”. Entretanto, distinguiu a prescrição da decadência, esclarecendo que a segunda representa a perda de um direito, propriamente dito, pelo decurso do tempo sem iniciativa do interessado. “Enquanto a prescrição incide sobre a ação, a decadência incide sobre o direito material”, disse.
Ele citou o jurista Silvio Rodrigues, segundo o qual “o titular de um direito não pode permanecer inerte; ao contrário, deve ser solerte na defesa de seu patrimônio jurídico”. Plinio exemplificou com a situação de usucapião, em que ocorre a perda do direito de propriedade de alguém em favor de outra. “Se o proprietário permanecer inerte, não fizer nada ao ver sua propriedade ocupada por outro, perderá seu direito”, disse.
No direito civil, a vontade das partes tem preponderância significativa. Por isso, muitas das normas que estão em leis comerciais e no Código Civil são chamadas de dispositivas. Segundo Plinio, significa que se as partes silenciarem, a lei se aplica. As normas dispositivas permitem, inclusive, que as partes possam contratar de forma diferente da lei. Mas, no caso da prescrição, algo que interessa à sociedade, vigoram as normas cogentes, aquelas que não podem ser alteradas pela vontade das partes.
De acordo com o Código Civil (art.192), os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes. Segundo Plinio, nos tribunais, se o juiz se deparar com uma situação de prescrição, deve pronunciá-la, independentemente de provocação da parte. Mas, até 2011 não era assim que funcionava, a prescrição deveria ser provocada pela parte interessada e o juiz não poderia se pronunciar. “Hoje, se o juiz se deparar com a prescrição o processo será resolvido por mérito, ou seja, a ação não poderá ser novamente proposta”.
Plinio explicou, ainda, que a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, conforme define o artigo 193 do Código Civil. “Mesmo que a prescrição seja percebida somente na fase de recurso, pode ser levantada, sem violar qualquer norma”, disse. Segundo ele, o prazo prescricional sempre será definido pela lei, por se tratar de matéria de ordem pública. O artigo 205 define que a prescrição ocorre em dez anos, caso a lei não tenha fixado prazo menor. No Código Civil anterior este prazo era de 20 anos.
A prescrição no seguro
De acordo com o artigo 206 do Código Civil, o prazo de prescrição prescreve em um ano no “caso da pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele”. A lei também define que o prazo contado para o segurado, em caso de responsabilidade civil, “começa na data em que é citado a responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador”. Para os demais casos, o prazo é contado a partir da ciência do fato gerador da pretensão.
Porém, segundo o advogado, a jurisprudência mitigou esses números por entender que o aviso de sinistro suspende a contagem do prazo, que volta a fluir a partir da formalização da negativa do dever de indenizar. Ele conta que no passado, algumas seguradoras costumavam protelar o pagamento da indenização até atingir o vencimento do prazo de prescrição. Mas, na década de 60, o Supremo Tribunal Federal lançou uma súmula que suspendeu o prazo de prescrição a partir do aviso de sinistro, até que a seguradora se pronunciasse.
No caso de reparação civil o prazo é maior. O artigo 206 estabelece que prescreve em três anos a pretensão de reparação civil; e a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório. “Aquele que entender que o terceiro lhe prejudicou, tem três anos para reclamar seu direito”, disse, acrescentando que o mesmo prazo se aplica à pretensão do beneficiário contra o segurador. Em relação ao seguro obrigatório citado na lei, ele explicou que se trata do DPVAT e RCTR-C (transportador de carga).
Segundo Plinio, o juiz pode interromper a prescrição, mas somente uma vez, como prevê o artigo 202, desde que seja promovida no prazo e na forma da lei processual. Também poderá ser interrompida por protesto (ação na Justiça). Já o parágrafo único deste artigo, que trata da interrupção da prescrição, define que “recomeça a correr da data do ato que a interrompeu ou do último ato do processo a interromper”.
Plinio comentou que a suspensão da prescrição não pode ser confundida com interrupção. “Digamos que ocorreu o sinistro e eu avisei. Dois meses depois ocorreu a negativa da seguradora. Como o prazo é de um ano, o segurado terá 11 meses, porque consumiu um mês”, disse. No caso da interrupção, ele frisou que o protesto pode ser realizado no penúltimo dia do prazo e, com isso, o segurado ganhará mais 12 meses ou três anos se o seguro for de responsabilidade civil. “Já no direito civil e no criminal, quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”, disse.